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Inconsistências do STF em torno da contribuição assistencial aos sindicatos

A imprensa tem noticiado com insistência sobre o retorno da contribuição sindical, tornada facultativa pela Lei nº 13.467/17. O momento político é fértil para a discussão e os dirigentes sindicais habilmente dele se aproveitam.

 

 

A discussão que se trava em torno da possibilidade ou não de que a assembleia de trabalhadores decida sobre o desconto da contribuição assistencial nos salários dos empregados está muito longe de atender aos princípios constitucionais e democráticos que envolvem o tema e acaba por ofender o direito ao exercício da liberdade sindical.

E parece que o STF (Supremo Tribunal Federal) retomou o assunto para atender aos reclamos do sindicalismo acomodado na outrora contribuição sindical, com fundamentos que se chocam internamente com decisões anteriores daquela Corte.

Sobre o assunto, em 16 de agosto de 2019, dizíamos nesta coluna que:

 

 

“Desde a Reforma Trabalhista da Lei 13.467/17, o tema da obrigação dos empregadores de descontar dos seus empregados, sindicalizados ou não, o pagamento de contribuição aos sindicatos, por meio de aprovação em assembleia dos interessados, categoria profissional ou econômica, tem causado insegurança jurídica para as empresas. O cumprimento da norma coletiva traz potencial contingência porquanto poderia ser objeto de reclamação individual com demanda de reembolso dos valores descontados, quando se tratar de trabalhadores. O descumprimento, por seu turno, expõe as empresas a ações coletivas fundadas em convenções coletivas.”.

E, naquele momento, em 2019, citamos a liminar concedida pela ministra Cármen Lucia, em maio daquele ano, na Reclamação 34.889 do Rio Grande do Sul, seguindo decisão já concluída na Ação Direta de Inconstitucionalidade 5.794/DF, para suspender os efeitos do acórdão proferido pelo Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região, no Recurso Ordinário 0020275-53.2018.5.04.0405, que determinava à empresa os descontos de contribuição sindical dos salários de seus empregados. Muito embora se discuta o desconto em salários, a tese da decisão vale também para o custeio do sindicato patronal.

De fato, as recentes manifestações do STF parecem ignorar o respeito à compatibilização do direito fundamental à liberdade sindical e o caráter obrigatório e legítimo de desconto em salário para custeio de entidade sindical exigido, não mais por lei, mas por norma coletiva aprovada em assembleia da categoria profissional ou econômica.

Naquele mesmo artigo nesta coluna, trouxemos decisão do TST em torno do assunto, no mesmo sentido, nos seguintes termos:

“O site do Tribunal Superior do Trabalho trouxe notícia, no dia 14/8, que a 5ª Turma, em acórdão da lavra do ministro Breno Medeiros, em votação unânime, (Processo: RR-373-97.2018.5.07.0028) julgou improcedente a ação de cobrança ajuizada pelo Sindicato dos Trabalhadores nas Empresas de Refeições Coletivas e Afins no Estado do Ceará visando à cobrança da contribuição sindical dos empregados da MTD Petróleo.
A autorização prévia, expressa e individual do empregado para que seja realizado o desconto, de acordo com o artigo 579 da CLT, introduzido pela Lei 13.467/17, homenageia o exercício da liberdade sindical individual, de acordo com o que estabelece a Convenção 87 da OIT.
Segundo informa a publicação, ‘O relator [……] assinalou que, a partir da Reforma Trabalhista, o recolhimento da contribuição sindical se tornou facultativo. Na sua avaliação, embora o dispositivo não faça referência expressa nesse sentido, a interpretação da necessidade da autorização individualizada se “coaduna com o espírito da lei”, que pretendeu resguardar o princípio constitucional da liberdade de associação sindical’.”

A impropriedade da mudança de orientação do STF é preocupante do ponto de vista das garantias constitucionais, em especial do exercício da liberdade sindical. Como tivemos oportunidade de dizer,

“As ações de cobrança de contribuição expõem ainda mais os sindicatos à sua fragilidade de representação e confirmam a ausência de legitimidade no modelo de unicidade sindical. O conteúdo das demandas, de um lado, no mérito, fixa o sujeito passivo da obrigação que não integra a relação jurídica (o empregador) e, de outro, está a desafiar a competência da Justiça do Trabalho ou qualquer órgão arbitral para apreciar litígios dessa natureza cuja essência enfrenta um direito fundamental de liberdade consagrado no artigo 8° da Constituição Federal, de interesse público inexorável.”

Deste modo, quando os ministros do STF decidem pela constitucionalidade de que a contribuição assistencial possa ser fixada por assembleia dos interessados (Tema 935 da repercussão geral), não acrescenta nada de novo, dado que a prevalência da autonomia da manifestação da vontade coletiva. Todavia, inverter a forma de desconto, exigindo que o empregado manifeste sua oposição, revela absoluta ignorância dos conflitos que surgem na prática para fazer valer a oposição. De outro lado, vai perpetuando a unicidade sindical.

Em 5 de maio deste ano de 2023, nesta mesma coluna escrevemos sobre a posição do STF, dizendo que:

“A decisão do STF, de interesse constitucional discutível, permite que empregadores controlem dados sensíveis dos seus empregados quanto à opção política de se filiar ou não ao sindicato, infringindo, de modo flagrante, a Lei Geral de Proteção de Dados. Não cabe ao empregador o controle da sindicalização de seus empregados.
Poderiam dizer alguns ‘mas foi assegurado o direito de oposição aos trabalhadores’. Esse argumento é sofismático e revela desconhecimento da prática da recusa ao desconto e trata o sindicato como se fosse único na empresa. Melhor seria, em respeito à liberdade sindical, assegurar aos trabalhadores que se negam à contribuição sindical ou assistencial a formação de novos sindicatos em busca de maior identidade entre representantes e representados.
A decisão coloca o empregador na relação jurídica que não lhe pertence. Trata-se de relação direta entre trabalhador e sindicato, exclusivamente, não cabendo à empresa servir de caixa de arrecadação do sindicato.”

Ademais, a orientação que obriga ao pagamento de contribuição a sindicato se choca frontalmente com o direito fundamental da liberdade sindical da Convenção 87 da OIT, incorporado no artigo 8º da Constituição Federal em 1988, ao menos no seu caput.

 

Fonte > Conjur 

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